Sete andares. Apenas
uma porta. Cinco lindas janelas. Uma clarabóia.
Em frente à casa de Joana, havia um lindo jardim, onde
brotavam rosam brancas e amarelas. Ao acordar, todas as manhãs, o mesmo ritual:
Joana ia para o andar térreo, abria a pesada porta vermelha e deixava o ar
entrar. Inspirava lentamente sentindo o diafragma dilatar-se e ao expirar,
tocava com o pé direito e descalço a terra. Depois, subia perpassando
lentamente cada andar, abrindo cada uma das cinco janelas.
A escada caracol, bem no centro da casa, parecia uma
serpente e muitas vezes, dava a impressão de vibrar, contorcer-se, dançar. Cada
degrau parecia revelar um novo estágio de alvorecer, um novo amanhã. Em cada
degrau, todo um mundo de pulsações e ensinamentos.
No segundo andar, a vidraça da janela era um fogo vivo,
alaranjado. Nesse pavimento, Joana colocava toda sua vontade de vida que era
alimentada por uma lareira em constante brasa. “Jamais deixe esse fogo apagar”,
ouvira Joana da avó. Ela sabia que essa lenha precisava ser renovada por um
querer constante e firme, um verdadeiro compromisso de querer.
O terceiro pavimento era todo amarelo, inclusive a delicada
cortina de seda, que cobria a janela. Aqui, Joana preparava suas refeições.
Assava bolos de cenoura e tomava café. O alimento que Joana oferecia ao mundo
era antes regurgitado nesse lugar e tudo que pulsasse vida podia ser alimento,
inclusive palavras. Alguns eram doces no princípio, mas azedavam assim que tocavam
a língua da menina. Já outros, mais raros, chegavam com a amargura do boldo, mas
aos poucos se mostravam como remédio salutar e traziam bem estar.
Mais um lance de escada acima e estávamos no andar verde. A
janela desse espaço não tinha cortina, mas o vidro era também verde e coloriam
os raios de sol que banhavam todo o ambiente. Tapete verde. Almofada verde. No
centro uma banheira com água de esmeralda e sais relaxantes. Aqui era o andar
dos banhos e do amor.
Quando
queria telefonar para alguém, ouvir uma música ou mesmo acessar uma rede social
– sim, Joana era antenadíssima – ela subia até o quinto andar, abria a janela
azul e lá ficava absorta nos papos com seus amigos, como se estivesse junto a
todos eles. Por toda a madrugada, ficava Joana no exercício do que chamamos de
comunicação. Comunicava muito mais que palavras, pois comunicava sensações,
impressões e basicamente silêncios.
Para o sexto pavimento Joana só ia de vez em quando. Uma
luneta. A lua e São Jorge. Tinha lugar para o dragão também, já que Joana nunca
fora dessas de negar a salamandra que dormita em sua alma. A janela, que era
redonda, sem cortinas, só se abria quando Joana chegava sem expectativas. Caso
contrário, permanecia hermeticamente fechada, como se mãos invisíveis ali
estivessem presentes.
E o sétimo andar? No sétimo andar, Joana só subia uma vez ao
ano para limpar a clarabóia, que era do mais fino cristal e se abria para o
céu. E não era assim de qualquer maneira que Joana lá entrava, não. Antes de ir
ao sétimo andar, Joana, primeiro descia, pisava descalça na terra e colhia sete
rosas brancas. Com estas, Joana preparava um chá e lavava seu corpo na sala dos
banhos e do amor. Depois, lentamente, Joana subia cada degrau que separava o
sexto do sétimo andar. Joana só podia adentrar o sétimo andar estando
completamente nua. Para o sétimo andar, Joana só tinha a entrega e a confiança
e lhes guiar.
Ali, Joana, nua, deitada olhando o céu, ouviu o nome de
Deus...
...e seu nome era...